Ônibus do sistema BRT de Campinas, estacionado na plataforma da estação Rodoviária.

CARTA ABERTA AOS PALADINOS DA DESGRAÇA

Me chamo Fabio Trindade, sou só mais um nesse mundo que dia após dia, faz e tenta aprimorar seus trabalhos na área de atuação dentro do setor de transporte coletivo por ônibus em prol de um serviço cada vez melhor.

Tem quem diga que somos uma minoria, que chegamos a tal ponto, que talvez as ações positivas já não surtem mais o efeito esperado devido ao grande índice de atenção as ações negativas, frustrando ainda mais o prazer de trabalhar com o que fazemos… por outro lado, acredito que somos uma maioria não observada.

O setor que sempre foi bombardeado pelos grandes canais televisivos agora conta com o apoio de outros meios menores e até mesmo veículos que se dizem especializados no setor e em especial, nos últimos tempos, uma avalanche de notícias consideradas “negativas” em especial ao excesso de acidentes envolvendo ônibus, aumento de tarifa e sucateamento das frotas existentes.

Antes mesmo de começar, é extremamente importante deixar claro que não se trata de um pedido de censura ou muito menos a tentativa de calar aqueles que dedicam do seu tempo e promovem seu trabalho, levando informações e notícias sobre o setor, mas de um apelo pelo equilíbrio.

Cresci e vivo em Taboão da Serra, uma cidade da Região Metropolitana de São Paulo, conhecida pela intensa participação nos noticiários voltados aos crimes cometidos no município. Aos 16 anos, escrevi um pequeno texto para um trabalho escolar, apelando para que exista o mesmo empenho em falar sobre as ocorrências policiais que envolvia o nome da cidade, mas também que fosse noticiado o que havia de bom e seus personagens munícipes que se dedicavam em praticar o bem e fazer a diferença de forma positiva. O texto rendeu uma boa nota e foi até parar no editorial de um pequeno jornal de bairro que já não existe mais e hoje, me vejo na possibilidade de reescrever nesta mesma magnitude, mas voltada para minha área de atuação profissional.

Antes de qualquer coisa: seria possível afirmar que a sociedade brasileira consome mais as notícias trágicas do que as positivas? Seria este um problema cultural? Pode ser!

Voltando ao ônibus…
Como citei ali em cima, o setor sempre foi muito bombardeado com as notícias negativas. Focadas na qualidade dos coletivos, os aumentos de tarifa, longos intervalos e superlotação, lideram as chamadas jornalísticas nas televisões já nos jornais matinais, aliadas com o sensacionalismo de quem apresenta ou indica a reportagem e facilmente abraçada pelos entrevistados e espectadores que exaltam suas reclamações e muitas delas até que com razão, mas tratada de forma superficial com quem aponta, quem indica, quem gerencia e também de quem opera. Questionamentos feitos, que quando são respondidos, são através de notas automáticas, repetitivas e até mesmo, sem nexo algum.

Qual a dificuldade de responder a altura e a transparência necessária que tais situações exigem e que trás até mesmo a possibilidade de entendimento de quem usa o ônibus por gente que não consegue nem citar corretamente a determinada tecnologia circulante nas linhas em operação? Parece ser um ciclo vicioso para empregar gente inútil em cargos que seriam facilmente trocados por gente com sede e vontade de fazer acontecer.

Se por um lado, evitar responder determinados questionamentos de forma pífia, ajuda a manter o emprego de gente inútil, é possível afirmar que quando os questionamentos sobre as principais mazelas enfrentadas pelo setor de transporte por ônibus forem escancaradas, virá a tona uma série de falhas de gestão pública que ora por muito tempo, foi maquiada ou escondida para solucionar tais questões.

Citar que a superlotação dos coletivos nos horários de pico, revela a falha na execução de plano diretor que por sua vez, não cumpre metas de aproximar locais para trabalhar da residência das pessoas, reduzindo assim a possibilidade de menor uso de veículos, transporte e até mesmo, menor tempo dentro dos ônibus, afetando diretamente a qualidade de vida dos cidadãos, principalmente daqueles que atuam no terceiro setor, mas que estão em empresas que se modulam em ter seu funcionamento dentro do chamado “horário comercial”, horário esse que nem sempre está alinhado com as necessidades de seu público.

Citar que os veículos quebram constantemente devido a péssima qualidade da malha viária das cidades que são abandonadas ou construídas e organizadas de forma inadequada, sem pensar no meio de transporte responsável por transportar a maioria dos brasileiros? Seria importante também levar em pauta a escassez de profissionais capacitados para exercer funções completamente necessárias para o bom funcionamento do ônibus, em especial os instrutores, motoristas e mecânicos.

A ausência de profissionais faz com que aumente a carga de trabalho dos já existentes e afim de reduzir o impacto da falta de profissionais e consequentemente de coletivos nas ruas, aumentando o stress e a falta de tempo para se dedicar a ações que tragam conforto mental e o profissionalismo constante através de treinamentos que aprimoram as ações rotineiras destes profissionais que são linha de frente de todo e qualquer julgamento cometido toda vez que os noticiários levam para os consumidores de conteúdo, algum acidente envolvendo o ônibus e pré condenando o profissional envolvido, onde em muitas das vezes, não sobra sequer, um mínimo espaço para defesa.

Não está na hora de falarmos sobre o que compõe o cálculo da tarifa de ônibus e seus subsídios (quando existe), para que aqueles que reclamam, tenham ciência do que serve e para que se aplica os valores cobrados? A falta de transparência sobre este assunto, abriu a brecha para assuntos como a tarifa zero, que não conta com nenhum conhecimento abrangente sobre a informação de quem irá pagar a conta de um serviço que custa caro, mas é maquiado pelos gestores públicos que usam o transporte para palanque político. Condenam aquilo que eles mesmos controlam fora das eleições e promete melhorar nas suas campanhas eleitorais, coisa que não fizeram durante seus mandatos.

Políticos e defensores de pautas egocêntricas sem transparência agem no silêncio do viralatismo simbólico da mediocridade. E tem quem aplauda isso como algo maravilhoso.

A quantidade absurda de CNHs aprovadas mediante propina ao longo das últimas décadas para carros de passeio e motos, reflete em um trânsito mais lento, violento e cheio de barbares durante todo dia e em qualquer lugar. Mas não devemos abordar isto, apontaria um grande problema público que afeta diretamente o grande índice de acidentes envolvendo o transporte coletivo, que além de muitas vezes, pré julgado nos textos sensacionalistas que induzem ao pensamento de culpa ao motorista profissional, a justiça tem a estranha mania de dizer que quando o motorista é profissional o mesmo deve prever a falha dos veículos menores.

A transparência a fundo que envolve os problemas do transporte coletivo, mas são negadas por aqueles que deveriam mostrar todos os lados de um mesmo fato (acredito que essa é uma das maiores premissas jornalísticas), iria escancarar muita coisa, principalmente a ineficiência daqueles que mais deveriam atuar e trabalhar em prol do modal.

O massacre midiatico feito não somente pelos jornais e TV de todo país, ganhou força e intensidade quando até mesmo a parte considerada especializada, passou a agir igual ou até mesmo pior do que os meios já tradicionais, estes quem chamo de PALADINOS DA DESGRAÇA.

O apelo ao qual faço de forma simples neste texto, é que exista o mesmo empenho que tem para noticiar um sinistro, que seja igual para aqueles que se dedicam de corpo e alma, fazendo até mais do que o esperado pelas suas funções direcionadas.

O ônibus tem muita gente boa, dedicada e principalmente, empatica. Gente que não desiste, que dá o seu melhor e se destaca positivamente, mas são deixados de escanteio com a avalanche de notícias consideradas ruins.

Sabemos que além da cultura Brasileira consumir em preferência notícias ruins, com tom negativo e principalmente com títulos sensacionalistas, que geram o click e o like de forma rápida e simples, promovendo uma cachoeira de ações que visam o mais fácil, mas nem sempre o que é certo.

O conteúdo positivo, aquele que vai destacar as boas ações, também serão consumidos pelos seus respectivos leitores e também irá gerar audiência, por mais trabalhoso que seja produzir este tipo de material e sempre que destacado, terá seu público alvo atingido e que também buscam por estes materiais. Todos ganham.

É preciso lembrar que empresas, entidades representativas e órgãos gestores, façam a sua parte de destacar e mostrar o lado positivo, respondendo em nível e a altura de todo e qualquer questionamento feito pelos meios de comunicação e façam seus trabalhos que busquem o viés positivo para que este material esteja ali, disponível para quem quiser replicar e aumentando assim, maior alcance dos bons conteúdos a quem tenha interesse.

+1 vez, isto não é um pedido para parar com o que escolhem noticiar, mas que também deem ênfase ao positivo e que as empresas e seus representantes se esforcem para mostrar isso.

A delícia de ser independente, por mais difícil que seja manter esta postura, sem depender de vínculo político, ideológico ou praticar o puxa-saquismo que move parte do mundo, é saber da importância de que notícias sejam vinculadas sem censura mas que também possa cobrar para que seja citado aquilo que também é agregador e bom, como as boas histórias.

Na via de mão dupla, destacar o positivo só trará benefícios. No trabalho que mais carrega sonhos das pessoas, como por exemplo, resgatar a paixão das pessoas em trabalhar com ônibus. Algo que antes era uma referência, hoje se reflete na falta constante de profissionais para preencher seus quadros, não se tratando apenas do “tá insatisfeito, dá lugar para quem quer trabalhar” frase tipicamente ouvida por quem já cometeu alguma falha e gerou uma indignação mesmo que passageira em alguma pessoa que estava embarcada no momento em questão.

Em tempo de certezas absolutas, afirmar que o ônibus sozinho não é culpado pelo mar de falhas que acompanham o modal é como querer chamar para si só uma grande briga política.

Equilíbrio e bom senso não faz mal a ninguém e pode ser usado sem moderação.